Henrique Meirelles: ‘Brasil e China no espelho’

Para atingir o crescimento sustentável, a China agora se esforça para reduzir investimentos, elevar salários e consumo interno; já o Brasil, em movimento inverso, precisa aumentar o investimento e reduzir a contribuição relativa do consumo, avalia, em artigo, o ex-presidente do BC.

16/03/2014

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Henrique Meirelles,  coordenador do Conselho de Política Econômica do Espaço Democrático e ex-presidente do Banco Central. 

A China tem como meta reduzir o crescimento da década passada e estabilizá-lo em patamares mais sustentáveis por meio de um “pouso suave”, que evite crise na correção dos excessos. Já o Brasil tenta recuperar as taxas de crescimento da década passada, mais em linha com o potencial do país no longo prazo.

A China pretende diminuir o investimento excessivo, particularmente em infraestrutura, que gerou capacidade ociosa. Já o Brasil precisa desesperadamente aumentar o investimento em geral e, de forma urgente, na infraestrutura.

A China tem como grande desafio reforçar o consumo doméstico como propulsor do crescimento e elevar a renda média. O grande desafio do Brasil é reduzir a contribuição relativa do consumo no crescimento, criar as condições para aumentar investimentos e equilibrar oferta e demanda, viabilizando a queda da inflação e do deficit nas contas externas.

Os dois países cresciam a taxas robustas (segundo seus potenciais) até a crise financeira de 2008 e reagiram de formas diferentes a ela.

A situação no Brasil foi mais grave. O colapso do crédito internacional, que era cerca de 20% do total, provocou crise de liquidez e dúvidas sobre empresas e bancos. A resposta do Banco Central foi liberar liquidez de forma rápida e decisiva. Paralelamente, foram concedidos estímulos tributários ao consumo. A reação eficiente permitiu rápida recuperação. A economia cresceu 7,5% em 2010, ano em que o Banco Central retirou os estímulos monetários –os fiscais foram mantidos.

Já a China foi atingida pela crise via queda das exportações, motor do seu crescimento por décadas. Sua reação foi elevar fortemente investimentos em infraestrutura e no mercado imobiliário, com expansão agressiva do crédito.

Mas tanto a reação chinesa quanto a do Brasil atingiram seus limites no início desta década.

Na China, o excesso de investimentos criou capacidade ociosa, infraestrutura subutilizada, poluição alarmante e mercado de crédito com sinais perigosos de estresse. No Brasil, o prolongado estímulo ao consumo, sem investimento capaz de atender à demanda estimulada, gerou desequilíbrio nas contas externas e na inflação e um nó físico ao crescimento pela limitação da infraestrutura.

Em resumo, a China agora se esforça para reduzir investimentos, elevar salários e consumo interno e, assim, atingir um crescimento mais equilibrado e sustentável. Já o Brasil, em movimento inverso, precisa aumentar o investimento, particularmente em infraestrutura, e reduzir a contribuição relativa do consumo para também atingir o crescimento sustentável.

 Artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo em 16 de março de 2014.

 

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