Henrique Meirelles: ‘Meta na meta’

Boa parte da opinião pública passou a considerar a inflação próxima de 6,5% como na meta, o que indica possibilidades de o índice continuar acima de 6%, diz, em artigo, o ex-presidente do BC.

18/01/2015

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Henrique Meirelles, coordenador do Conselho de Política Econômica do Espaço Democrático e ex-presidente do Banco Central

A imprensa publicou nesta semana que a inflação ficou na meta em 2014 porque atingiu 6,41% no ano passado.

Por um lado, é uma boa notícia para o Banco Central. Manchetes de que o BC cumpriu a meta reforçam a credibilidade da instituição.

Por outro lado, é uma péssima notícia para o BC porque revela que, depois de insistentes declarações de autoridades, boa parte da opinião pública passou a considerar a inflação próxima de 6,5% como na meta. Isso transmite aos formadores de preço a mensagem de que, se uma inflação de 6,5% é aceitável, as possibilidades de o índice continuar acima de 6% são elevadas. Nesses termos, a tendência é de eles aplicarem aumentos também acima de 6% ao ano.

Isso é o que forma a chamada expectativa de inflação. Se os formadores de preço tendem a remarcá-los a uma taxa elevada, a atividade econômica e o consumo terão de cair mais do que o necessário para trazer a inflação para a meta, estipulada no Brasil em 4,5%.

No caso da Europa, ela está ao redor de 2%, mas a região se vê ameaçada por uma taxa bem menor por causa não só da baixa atividade econômica e expectativa inflacionária, mas também da queda de preço de commodities como o petróleo. A Europa, por isso, começa a debater formas alternativas de fixação de metas para reduzir a influência da variação dos preços das commodities na inflação.

Nos EUA, esse problema foi enfrentado, quando o Fed (o BC do país) fixou como medida oficial o chamado núcleo de inflação, que exclui os preços mais voláteis como alimentação e energia.

A grande vantagem do sistema europeu e de outros países diante do americano é que ele inclui todos os itens da inflação no índice divulgado pelos meios de comunicação, e não apenas o seu núcleo, o que facilita o entendimento do cálculo por toda a população. Por outro lado, esse índice é impactado por itens não controláveis pela política monetária, complicando as decisões.

No Brasil, a solução foi a definição de uma meta de inflação incluindo todos os itens, mas com um intervalo de tolerância, para acomodar exatamente esses choques de oferta, como variações bruscas, para cima ou para baixo, do preço dos alimentos.

Por outro lado, como vemos hoje, nosso sistema dá margem para que a inflação acima da meta seja considerada adequada porque está na margem de tolerância.

Portanto, para aperfeiçoar o sistema e trazer a inflação para o patamar correto, é preciso definir com clareza que a meta é 4,5% e que a tolerância apenas existe para situações excepcionais e transitórias.

 

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