Associação Comercial de SP abre o debate sobre a revisão da Constituição

Parlamentares, acadêmicos e empresários discutem em São Paulo a Assembleia Constituinte Exclusiva proposta pelo Partido Social Democrático (PSD)

17/10/2011

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A proposta de revisão constitucional, em tramitação no Congresso Nacional por iniciativa do Partido Social Democrático, começou a ser discutida pela sociedade brasileira nesta segunda-feira (17/10), durante debate na Associação Comercial de São Paulo (ACSP). Representantes de diversos segmentos sociais e integrantes do Conselho Político e Social da entidade participaram de palestra do jurista Ives Gandra da Silva Martins sobre o tema e, em seguida, debateram a proposta. Vários deles aprovaram a ideia de se eleger em 2014 uma Assembleia Constituinte Exclusiva para que sejam feitas as reformas necessárias à modernização do País. Outros, porém, manifestaram o receio de que a revisão crie oportunidade para retrocessos econômicos, sociais e políticos.

 

Ives Gandra: "É preferível correr riscos a ter o STF decidindo sobre tudo."

Também participaram do evento o presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab, e o responsável pela Fundação Espaço Democrático, o vice-governador de São Paulo Guilherme Afif Domingos.Para Ives Gandra Martins, a reforma é urgente e os eventuais riscos desse processo podem e devem ser encarados. “É preferível correr esses riscos a ter o Supremo Tribunal Federal (STF) decidindo sobre tudo e sobre todos”. Ives Gandra lembrou que, desde 1988, o STF julgou procedentes 757 Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) e mais de 1.100 outras aguardam julgamento, sem falar nas 73 emendas aprovadas pelo Congresso nos últimos 23 anos. “Portanto, o que temos hoje é uma Constituição provisória, que pode mudar a qualquer momento. Este é, para mim, um risco muito maior. Assim, a questão que se coloca é: vamos desistir por causa das dificuldades que vislumbramos ou vamos tentar trabalhar pelos pontos que precisamos alterar?” – perguntou.O encontro na sede da ACSP foi aberto pelo presidente da entidade, Rogério Amato, segundo quem existe no setor de comércio um consenso em torno da necessidade de mudanças no sistema tributário e trabalhista, entre outros. “Por isso, para nós é muito importante apoiar a proposta de revisão constitucional”, afirmou (veja aqui o vídeo com a entrevista).

Para Kassab, o partido quer contribuir para que o debate sobre a reforma da Constituição tenha visibilidade, para que a sociedade tenha consciência de sua importância. “É preciso que todos saibam que as reformas são possíveis e que elas podem ser a melhor saída para o Brasil”, disse.

Afif, por sua vez, lembrou que, embora muita gente tenha receio de eventuais retrocessos num processo de revisão constitucional, “precisamos quebrar esse conservadorismo para chegar à modernidade”. Para ele, “a insatisfação já existe na sociedade e devemos responder às demandas por qualidade na saúde, na educação, na justiça. Sem isso, essa insatisfação vai crescer e chegará às ruas”, afirmou, lembrando que muitas das mudanças que precisam ser feitas hoje não seriam aprovados no Congresso, mas passariam em uma Assembleia Constituinte.

Sem amarras

Katia Abreu defende constituintes sem vínculos com a política

Para a senadora, o grande número de propostas de modificação da Constituição hoje em tramitação no Congresso e no Judiciário – “e também a elevada carga tributária, que já se aproxima dos 40% da riqueza nacional e mesmo assim é considerada insuficiente pelo governo” – indicam que “devemos as reformas constitucionais ao País”.A senadora Kátia Abreu, também presente no debate, lembrou que a ideia de eleger os constituintes pelo sistema de listas apresentadas pelos partidos tem a vantagem de isolá-los dos compromissos partidários e políticos que se assume ao participar de uma eleição. “Os constituintes não terão de pedir votos, quem fará isso serão os partidos. Portanto, não terão as amarras que tolhem a ação dos parlamentares”, explicou.

Para o palestrante Ives Gandra, as inúmeras modificações realizadas ao longo das últimas duas décadas criaram uma situação em que a Federação se tornou maior do que o PIB. “O engessamento das contas públicas ocorrido nos últimos anos, gerando privilégios para os servidores públicos, transformou o contribuinte no verdadeiro servidor público: somos nós que pagamos tributos para manter essa classe privilegiada”, disse.

Na opinião dele, o sistema tributário da Constituição de 1988 foi muito bem montado, mas tão alterado ao longo do tempo para atender necessidades específicas que hoje a carga burocrática é que determina a carga tributária. “Mas acredito que podemos trabalhar na Constituinte para que o Brasil caiba dentro de seu PIB”, afirmou, ressaltando que os  constituintes devem centrar esforços em pontos como o sistema tributário, a ordem administrativa, o regime político e os encargos trabalhistas.

‘Aposta arriscada’


Denis Rosenfield: "Forças muito organizadas vão impor suas agendas à Constituinte"

Denis Rosenfield, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e articulista do jornal O Estado de S. Paulo e da revista Veja, foi um dos participantes que mostrou preocupação com os riscos de retrocesso no processo de reforma constitucional.  Para ele, uma Constituinte é uma aposta extremamente arriscada. “A proposta vai despertar forças muito organizadas, como o PT, a CUT e o MST. Eles vão se mobilizar e impor suas agendas à Constituinte. O primeiro artigo que vai passar é a volta da CPMF. O PIB vai ficar ainda menor”, previu.

O ex-secretário Everardo Maciel: preocupação com a proposta

Também o ex-secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, levantou dúvidas sobre a proposta. Para ele, a própria composição da futura Assembleia Constituinte Exclusiva é motivo para preocupação. “Não será uma assembleia só de sábios. Todos os setores vão se organizar para participar. E a experiência mostra, por exemplo, que todas as revisões constitucionais que tivemos levaram a um sistema tributário pior que o anterior. O atual sistema tem alguns defeitos, mas eles podem ser corrigidos por lei ordinária”, opinou, observando que o mesmo pode ocorrer na reforma previdenciária. “A capacidade de organização daqueles que querem tornar esse sistema ainda mais complexo é muito grande”, afirmou.

O ex-deputado federal Paulo Delgado, do PT, apoia a proposta de revisão. “O sistema legal brasileiro não permite que o País deslanche, sofremos com problemas como o que chamo de ‘enrosco processual protelatório’, que ocorre em todas as esferas. Não há autoridade moral que defina as situações, tudo vai sendo protelado, empurrado para a frente. Outra característica negativa é a que chamo de Constituinte Permanente. É impossível permanecer legal no Brasil, pois a lei muda todo dia. Portanto, a ideia é boa, pois a Constituinte é um processo de renovação”, concluiu.

Previdência

Para o ex-ministro da Previdência Social (governo FHC), Roberto Brandt, a reforma constitucional é absolutamente necessária. “Dá para dizer que de 1988 para cá um século se passou, dada a velocidade com que as mudanças ocorreram”. Segundo ele, a própria Europa, que foi um modelo para os constituintes de 88, está mudando profundamente e sairá da atual crise completamente modificada. No entanto, ressalvou ser contra a discussão de mudanças na Previdência no âmbito da Constituinte. “Falar em reforma previdenciária provoca mais barulho que resultados. Aliás, acredito mesmo que não há o que mudar na Constituição nesse campo. Basta que preservemos o que foi duramente conquistado nos dois últimos governos e que aprovemos a lei da previdência complementar dos servidores públicos, na União e nos Estados, parada no Congresso desde 2003. Assim, estaremos assegurando que as futuras gerações tenham melhor saúde, melhor educação, mais segurança e um Estado mais eficiente e funcional.”

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